A primeira coincidência

18 de jul. de 2014

Te olhando, inquieta no berço, consigo me lembrar dos últimos momentos antes do seu vir. Tenho a impressão de que aquela fase em que você se vestiu completamente da minha redoma, foi a tua época de maior proteção. (E minha também, já que no momento em que te vi, tive a certeza de que jamais respiraria tranquila se não soubesse da sua segurança).

Ainda sinto a tua dança no meu ventre. A sua ansiedade em querer nascer logo era algo que me comovia. E você nem imagina o que vem por aí, pequena. Teu mundo ainda se resume a um retângulo de grades almofadado por travesseirinhos e a “Girapuff”, que é o bichinho de pelúcia que você adora. Preciso te dizer que a vida é muito mais que isso.

Os dias vão passar tão rápidos e você nem se dará conta. Só mais tarde, talvez, você terá ideia de como era bom- isso se chama nostalgia. Mas não se permita cultivá-la. Seguir em frente é o seu mantra.

 Eu sei que chegará o seu dia de bater as asas. O medo tomará conta de você e o seu primeiro pensamento será "Vou cair”. Eu sei por que já passei pela mesma coisa. Mas quando enfim tiveres coragem e lá do alto a vista for maravilhosa, você rirá da sua própria bobagem. Porque voar, ainda que amedronte no começo, traz recompensas lindas. Além disso, sempre terás um ninho para onde voltar.

Também sei que terão dias em que se revoltará e resolverá sair da linha. Eu vou me desesperar e me perguntar onde foi que eu errei? Talvez você se arrependa e me destine um pedido de desculpas e aí meu coração só vai querer te amar ainda mais.
Não tardará o dia em que eu vou chorar e me intitular como uma mãe fracassada (a mais fracassada do mundo, fruto do meu hiperbolismo) e você vai se sentir impotente. E se puxar a mim, vai me abraçar em silêncio e então tudo fará sentido.

Virão brigas, o primeiro amor que nem sabe que é amado, a primeira prova final, a reunião com os professores, o pedido para ir falar com a que você mais gosta porque sabe que vou ouvir só elogios... Meu coração vai dobrar de tamanho quando passares no vestibular e se apertará com uma ligação sua que não chega em uma festa de madrugada.

Quero te lembrar que vai nublar, algumas vezes. Parecerá fácil ser levada pela correnteza e não remar em favor do que te faz bem. Algumas vezes se sentirá sozinha mesmo sendo cercada por pessoas que te amam e admiram tua suavidade, que Oxalá, permanecerá fazendo parte de ti.

Sei que se puxar a tua avó seu coração será entregue para muitos garotos. Muitos o quebrarão em mil pedaços. Você vai achar que só poderá reconstruí-lo com outro alguém mais cuidadoso ou vai dizer que nunca mais quer saber desse trem esquisito chamado amor na sua vida. Ou talvez aprenda por si mesma e com tempo que só quem te merece a ama o suficiente, só quem sabe o que você precisa e colará os cacos do teu coração tão puro, é a pessoa que você vê refletida no espelho.

Mas espero que apesar de tudo, inclusive do ciúme doentio do seu pai, você encontre alguém para andar de mãos dadas na praça, vendo o pôr-do-sol e cantando antigas cantigas de amor. Porque acredite, meu bem, é bonito se entregar.

Vou rir do seu frio na barriga quando vier apresentá-lo aqui em casa e o medo de que a gente cometa alguma gafe. Vou rir da cara de ciúmes do seu pai, buscando mil defeitos e interrogando o rapaz como se fosse um delegado, e odiando admitir o brilho que você emite quando está ao lado dele.

Talvez chegue, e até rápido demais, a fase em que você sentirá vergonha de mim e me pedirá para parar a duas esquinas da escola. E eu vou fazer de tudo pra te pirraçar. Sei que vou te amar a cada vez que te olhar e analisar seus trejeitos iguais aos meus, te amar de domingo a domingo sem feriados e pausas, ininterruptamente, te amar quando você vier chorar no meu colo, quando te ver dar os primeiros passos, quando te admirar em uma foto... Te amar ao olhar teu sorriso e constatar que, só por te ter ao meu lado, o meu ainda consegue ser maior que o seu.



P.S: Pari esse texto hoje, quando ficticiamente, me vesti de mãe.

11 comentários:

Lucas - Blog: Overture disse...

Reparei que não tens o espaço dos seguidores. Seria muito bom seguir-te. Teus textos são muito bons. Mas, principalmente seria bom porque, quando te seguimos, tudo que postares aqui aparece lá em nosso blogue e assim podemos vir aqui, comentar. Reparei também que tens demorado a escrever. Três postagens em um ano!
Contudo, teus textos são excelentes. Esse é excelente. Não se pode dizer se são reflexos de ti mesma e de tuas reações, e das reações de teus pais, lançados sobre a filha imaginária, ou se são experiências recolhidas da observação da vida. Mas és muito convincente. No começo da leitura, estava por dar-te os parabéns por ela e perguntar por que não postastes seu nome.
Ter filhos é, de fato, todo esse padecer no paraíso que registraste. Embora essa seja a abalizada palavra de alguém que não é pai. rs
És bela no que escreves. Tens um dom muito especial. Beijossssssss

Thaís. disse...

Problema resolvido, moço. Muito bom ler tanto carinho em um comentário. A casa tá sempre aberta! Beijos

Jéssica Teles disse...

Simplesmente apaixonada pelo seu texto. Encantada. Me sentindo filha, mãe, tia, vó, importante.
Seus textos, sempre tão bons *-*
Beijo!
Goiabasays

Rosemary Lima disse...

Thais obrigada pela visita lá no blog. Gostei muito daqui, visitarei sempre que possivel e to seguindo tá?!

Beijos!

Aline Goulart disse...

Belíssimo texto. Conseguiste ter uma visão de quem sabe amar de verdade, ou seja, a visão de uma mãe. Obrigada pela sua doce presença. Volte sempre! Beijos.

João52 disse...

Passando para me embeber nas tuas letras que dão asas á imaginação de cada um dos teus leitores... É sempre um prazer te ler... Bem haja... Saudações poéticas

Raphaela Barreto disse...

E eu pensando que ti já eras mãe kk Adorei o texto, realmente parecia uma mãe - e deve ser maravilhoso o ser.
Adorei seu cantinho e estou a seguir, coloquei o link do seu blog, no meu blog na guia "101 blogs"

Beijos e ótima semana
http://mylife-rapha.blogspot.com

Raquel disse...

Ai que lindo, me vi, como vc, parindo mentalmente... aliás como ando fazendo muitos nos últimos meses, pensando em ser mãe!! E estão ai todos os pensamentos que tb passam pela minha cabeça, escritos em teu texto! (tirando a parte do não cultivar a nostalgia, rs... pq afinal de contas sou viciada nisso, é meu combustivel, minha identidade hahahah).
Curti, voltarei outras vezes.


;]

Rebeca Postigo disse...

Será que você ainda não é mãe?!
Hahaha...
Sua escrita fluida ficou muito realista, Thaís!!!
Eu adorei te ler e sem querer... Sentir profundamente o sentimento dentro das tuas palavras...

Saudades de te ler!!!

Bjo, bjo!!!

P.S.: Meu blog mudou, agora você me encontra no http://mesmiceseepifanias.blogspot.com.br

Bernard Freire disse...

Ai tu te veste de mãe e sai arrancando impressões diferentes dos leitores.
Parabéns pela escrita. Escreveste palavras belas e soube narrar com emoção cada parte. Fazia tempo que não lia um texto que deixa minha imaginação apaixonante. Tinha até esquecido como é escrever sobre amor.
Hoje eu estou tão duro que cai por aqui me quebrando todo.
Eu não sei com qual sentido elaboraste isso, mas a atenção roubou o foco do pensamento que se espremeu numa possível lagrima. Valeu por me relembrar que ainda existe palavras belas. Vou tentar usa-las em algum momento certo.

Obrigado pela visita, eu esqueço que isso aqui existe. Fez parte de um momento em que eu guardava os problemas tudo dentro de uma caixinha. Eu joguei fora ela, não me servia mais. E tudo que tá ai no teu texto, brincou de dizer: "Ei, a vida segue. Faz logo tudo o que tu queres"

Vou ver se entro com mais frequência por aqui se o tempo deixar.

Abraços.

Gabriela Furtado disse...

Que texto!!!!!!
Li e sem me dar conta fui me vestindo de mãe também, sem nem imaginar que tuas palavras eram ficção.
Parabéns, texto realmente muito lindo.
Bjas







Design e código feitos por Julie Duarte. A cópia total ou parcial são proibidas, assim como retirar os créditos.
Gostou desse layout? Então visite o blog Julie de batom e escolha o seu!